Depressão não tratada em autistas pode levar ao suicídio: é preciso agir

A depressão em pessoas autistas, quando minimizada ou ignorada, pode trazer riscos sérios à vida, incluindo pensamentos e comportamentos suicidas. Este post é um alerta para a importância do diagnóstico precoce, da escuta empática e do tratamento adequado da saúde mental no autismo.

A depressão em autistas e suicídio é um tema urgente e sensível que precisa ser discutido com responsabilidade. Diferente do que muitos imaginam, pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) sentem profundamente — e podem vivenciar dor emocional intensa, mesmo que não consigam expressá-la com clareza. Quando essa dor é ignorada, mal interpretada ou negligenciada, o risco de agravamento do quadro é real — e, infelizmente, pode culminar em ideias ou tentativas de suicídio.

Segundo estudos recentes, o risco de suicídio em pessoas autistas é significativamente maior do que na população neurotípica, principalmente entre mulheres e adultos com suporte nível 1. Isso se deve a uma combinação de fatores como exclusão social, camuflagem (masking), diagnóstico tardio, invalidação emocional e falta de acesso a cuidados em saúde mental.

Depressão no autismo: por que é subestimada?

Muitas vezes, a depressão em autistas é interpretada erroneamente como uma característica do próprio TEA. O retraimento, a falta de iniciativa ou a alteração de humor podem ser atribuídos a traços do espectro — e não a sinais de sofrimento psíquico.

Além disso, pessoas autistas costumam ter dificuldade em expressar sentimentos de forma verbal ou clara. Isso significa que o sofrimento pode passar despercebido, mesmo por familiares e profissionais. O resultado é um atraso no diagnóstico, na oferta de apoio e no início do tratamento adequado.

Esse cenário é ainda mais grave quando a própria vivência da pessoa é invalidada com frases como:

  • “Isso é só uma fase.”

  • “Todo mundo tem dias ruins.”

  • “Mas você nem parece estar mal.”

Esse tipo de resposta pode aprofundar o isolamento e aumentar o risco de comportamentos autodestrutivos.

O que dizem os dados sobre suicídio e autismo?

Diversos estudos alertam sobre o aumento do risco de suicídio entre pessoas autistas. Um dos mais referenciados foi publicado na The Lancet Psychiatry, mostrando que:

  • Pessoas com TEA, especialmente mulheres, têm maior probabilidade de apresentar pensamentos suicidas;

  • Cerca de 66% dos adultos autistas relatam já ter tido ideação suicida em algum momento da vida;

  • Pessoas com autismo sem deficiência intelectual correm maior risco de tentativa de suicídio do que aquelas com deficiência intelectual associada.

Esse dado pode parecer contraintuitivo, mas é compreensível quando se considera que pessoas autistas com alta funcionalidade muitas vezes têm maior percepção das próprias dificuldades, enfrentam pressões sociais para se adaptar e camuflar comportamentos (masking), e frequentemente são diagnosticadas tardiamente — o que dificulta o acesso precoce ao suporte.

Principais fatores de risco

  • Diagnóstico tardio ou inexistente de TEA

  • Histórico de bullying, exclusão e rejeição social

  • Depressão não diagnosticada ou mal tratada

  • Dificuldade de pedir ajuda ou expressar sofrimento

  • Alta exigência de adaptação ao mundo neurotípico

  • Falta de redes de apoio e compreensão

Sinais de alerta: o que observar

Alguns comportamentos que podem indicar sofrimento emocional grave em autistas:

  • Alterações abruptas no padrão de sono, alimentação ou higiene;

  • Comentários indiretos sobre desaparecer, sumir ou não aguentar mais;

  • Isolamento maior do que o habitual;

  • Perda de interesse por atividades favoritas;

  • Regressão de habilidades já adquiridas;

  • Desorganização na rotina ou atitudes impulsivas.

Esses sinais, mesmo que sutis, merecem atenção imediata. A ideia de que a pessoa “sempre foi assim” não deve impedir a observação cuidadosa de mudanças no comportamento.

Como prevenir e proteger: caminhos possíveis

1. Leve a dor emocional a sério

Mesmo quando não é expressa com palavras. A empatia salva vidas. Não espere que a pessoa peça ajuda — observe, se aproxime com cuidado e ofereça presença.

2. Promova acompanhamento psicológico especializado

Psicoterapeutas com experiência em TEA e depressão são fundamentais para que a pessoa possa encontrar um espaço seguro de acolhimento e elaboração do sofrimento.

3. Considere avaliação psiquiátrica

Em casos moderados a graves, ou quando houver risco de suicídio, o uso de medicação antidepressiva pode ser essencial. O tratamento deve ser sempre individualizado.

4. Fortaleça redes de apoio

Família, escola, amigos e profissionais precisam estar em sintonia para garantir suporte contínuo. Grupos de acolhimento e redes online também podem ajudar a reduzir o sentimento de solidão.

5. Evite frases que invalidam a dor

Em vez de dizer “vai passar” ou “você precisa reagir”, diga:

“Eu estou aqui.”

“Você não está sozinho.”

“Vamos procurar ajuda juntos.”

Conclusão

Minimizar a depressão em autistas é correr o risco de ignorar um sofrimento profundo e silencioso. O impacto de não tratar adequadamente essa condição pode ser devastador — tanto para a pessoa autista quanto para sua família e comunidade.

É preciso falar sobre o risco de suicídio no autismo com responsabilidade, acolhimento e compromisso com a vida. Diagnóstico precoce, escuta ativa, tratamento adequado e suporte contínuo são os pilares da prevenção.

Se você convive com uma pessoa autista ou é autista e está passando por um momento difícil, procure ajuda profissional. A dor pode ser profunda, mas ela não precisa ser vivida sozinha.

Referências bibliográficas

  1. Cassidy, S., et al. (2018). Risk markers for suicidality in autistic adults. Molecular Autism, 9(1), 42. https://doi.org/10.1186/s13229-018-0226-4

  2. Cassidy, S., Bradley, L., Shaw, R., & Baron-Cohen, S. (2018). Risk factors, protective factors and suicide in autism spectrum disorders. The Lancet Psychiatry, 5(12), 998–1008. https://doi.org/10.1016/S2215-0366(18)30343-4

  3. Hedley, D., et al. (2017). Suicidal ideation and attempts in autism spectrum disorder. Autism Research, 10(5), 811–821. https://doi.org/10.1002/aur.1735

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