Sono no Autismo: O que Funciona? Intervenções e Tratamentos para Dormir Melhor

Pessoas autistas enfrentam altos índices de distúrbios do sono, que impactam diretamente a qualidade de vida e o desenvolvimento. Este post aborda as intervenções comportamentais mais eficazes e os tratamentos medicamentosos possíveis, com base em evidências científicas e diretrizes clínicas atualizadas.

O sono de má qualidade é uma das comorbidades mais frequentes no Transtorno do Espectro Autista (TEA), afetando de 50% a 80% das pessoas com o diagnóstico. A boa notícia é que existem estratégias efetivas para melhorar o sono no autismo, que incluem tanto abordagens comportamentais quanto, quando necessário, o uso criterioso de medicamentos. Neste post, você encontrará um panorama das principais intervenções baseadas em evidências para lidar com os distúrbios do sono em autistas de forma segura e individualizada.

O que são intervenções comportamentais?

Intervenções comportamentais são estratégias não medicamentosas voltadas para modificar rotinas, comportamentos e ambientes a fim de promover um sono mais saudável. Elas são consideradas primeira linha de tratamento pela maioria das diretrizes clínicas, incluindo a American Academy of Pediatrics (AAP) e a American Academy of Sleep Medicine (AASM).

As mais recomendadas incluem:

1. Higiene do sono

É o ponto de partida. Envolve ajustar o ambiente e a rotina antes de dormir:

  • Criar uma rotina previsível e estruturada para o horário de dormir;

  • Reduzir o uso de telas ao menos 1 hora antes do sono;

  • Garantir um ambiente escuro, silencioso e com temperatura agradável;

  • Utilizar recursos visuais (como cronogramas ou histórias sociais) para sinalizar que a hora de dormir está chegando.

2. Treinamento de iniciação do sono

Técnica para ajudar a criança (ou adulto) a adormecer sozinha, reduzindo a dependência de estímulos externos (como a presença dos pais, TV ou movimentos repetitivos).

3. Extinção gradual ou reforço positivo

Baseia-se em ignorar gentilmente comportamentos de resistência ao sono (como choros, pedidos constantes para sair da cama) e reforçar positivamente comportamentos apropriados (ficar na cama, seguir a rotina).

4. Terapias comportamentais específicas

  • ABA (Análise do Comportamento Aplicada), que pode trabalhar hábitos de sono;

  • Terapia Ocupacional, com foco em modulação sensorial noturna;

  • Psicoterapia com foco em ansiedade relacionada ao sono.

Essas abordagens devem sempre ser personalizadas e supervisionadas por profissionais com experiência em TEA.

Quando considerar medicação?

Em casos em que as intervenções comportamentais não forem suficientes, e os distúrbios do sono estiverem causando prejuízos significativos, os médicos podem considerar o uso de tratamentos medicamentosos.

1. Melatonina

É o suplemento mais utilizado e estudado em pessoas autistas. A melatonina:

  • É segura e bem tolerada em doses baixas;

  • Pode ajudar a iniciar o sono mais rapidamente;

  • Tem poucos efeitos colaterais quando usada a curto e médio prazo;

  • Deve ser prescrita por um médico, especialmente para avaliar a dose e o momento ideal de administração.

Estudos mostram que a melatonina de liberação prolongada pode ser útil também para casos de despertares noturnos frequentes.

2. Clonidina

Um medicamento originalmente usado para pressão arterial, mas que tem efeito sedativo em doses baixas. Pode ser indicado em casos com hiperatividade ou ansiedade acentuada.

3. Risperidona ou Aripiprazol

São antipsicóticos atípicos, indicados apenas em situações específicas, geralmente para manejo de comportamentos severos associados à privação de sono, e nunca como primeira opção.

4. Outros medicamentos

Em alguns casos, neurologistas ou psiquiatras podem considerar medicamentos como antidepressivos sedativos (como a trazodona), sempre com cautela e monitoramento.

Importante: Medicamentos não devem ser utilizados como substitutos de intervenções comportamentais. Eles devem ser parte de uma abordagem mais ampla, sempre com prescrição e acompanhamento médico.

Abordagem integrada é o melhor caminho

Os estudos mais recentes apontam que os melhores resultados surgem quando combina-se o suporte comportamental com avaliação clínica contínua. Isso porque:

  • O sono pode ser afetado por comorbidades como ansiedade, TDAH e epilepsia;

  • Pode haver questões sensoriais que dificultam o relaxamento;

  • A estrutura familiar, as rotinas e o ambiente também interferem diretamente na qualidade do sono.

Portanto, contar com uma equipe multidisciplinar, que inclua pediatra, neurologista, psicólogo, terapeuta ocupacional e educador, é essencial para desenhar uma intervenção segura e eficaz.

Conclusão

Tratar os distúrbios do sono no autismo exige paciência, acompanhamento profissional e uma abordagem centrada na pessoa autista e suas necessidades. As intervenções comportamentais são a base, mas quando necessário, tratamentos medicamentosos podem ajudar, sempre com critério e responsabilidade. Cuidar do sono é cuidar da saúde física, emocional e cognitiva de toda a família.

Referências Bibliográficas

  1. Malow, B. A., Adkins, K. W., et al. (2012). Parent-based sleep education for children with autism spectrum disorders. Journal of Autism and Developmental Disorders, 42(6), 1127–1135.

  2. Rossignol, D. A., & Frye, R. E. (2011). Melatonin in autism spectrum disorders: A systematic review and meta-analysis. Developmental Medicine & Child Neurology, 53(9), 783–792.

  3. Gringras, P. et al. (2012). Melatonin for sleep problems in children with neurodevelopmental disorders: Randomised double masked placebo controlled trial. BMJ, 345, e6664.

  4. American Academy of Pediatrics (2023). Clinical Practice Guideline: Behavioral and Pharmacologic Treatment of Insomnia in Children with Autism Spectrum Disorder.

  5. Owens, J. A. et al. (2010). Pharmacologic management of insomnia in children and adolescents: Consensus recommendations. Pediatrics, 126(6), e1241–e1253.

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