Neste artigo, a Dra. Cristiane explica como a Terapia ABA promove autonomia, reduz comportamentos disruptivos e ensina habilidades essenciais para pessoas com TEA. Ela destaca o papel do acompanhante terapêutico (AT) como aplicador dos planos elaborados pela equipe, e defende o trabalho conjunto entre escola, família e equipe terapêutica para o desenvolvimento efetivo da criança. A abordagem baseada em neurociência torna as intervenções mais assertivas e humanas.
Dra. Cristiane, para quem está chegando agora no universo do autismo, o que é a Terapia ABA e por que ela é considerada uma das principais abordagens para pessoas com TEA?
É uma terapia baseada em evidências científicas, que tem como base a Análise do Comportamento Aplicada, a fim de planejar intervenções estruturadas para ensinar, habilidades sociais, comunicativas, emocionais e atencionais ao indivíduo com TEA.
Ela é considerada uma das principais, devido aos seus resultados na promoção de autonomia nos indivíduos com TEA.
Quais são os principais objetivos da ABA no dia a dia de uma criança ou adolescente autista?
A terapia ABA trabalha para tornar o indivíduo autônomo no desenvolvimento das tarefas diárias, das mais simples às mais complexas; além de reduzir os comportamentos disruptivos, ensinar o indivíduo a lidar com os desafios do dia-a-dia e assim, melhorar a sua qualidade de vida.
Muitas famílias escutam o termo “terapia intensiva” na ABA. O que isso significa na prática? Toda criança autista precisa de um plano intensivo?
A quantidade de horas em que um indivíduo estará submetido a Terapia ABA, depende de uma série de fatores, incluindo uma avaliação inicial para verificar em que estágio do desenvolvimento a pessoa está. Digamos que um adolescente de 12 anos é submetido a uma avaliação e há indícios de que as habilidades que ele desenvolveu até o momento da avaliação são compatíveis com o desenvolvimento de uma criança de 5 anos. Todo o programa de intervenção será planejado para que essa diferença seja sanada.
Como funciona o trabalho em equipe na ABA? Quem são os profissionais envolvidos além do terapeuta?
A equipe ABA pode ser composta de diferentes profissionais, mas há a necessidade de um supervisor, um coordenador e um aplicador. Esses profissionais podem ser de diferentes áreas, desde que tenham a formação adequada.
Quais são os primeiros sinais de progresso que os pais costumam observar quando o acompanhamento com ABA começa a dar resultados?
Um dos sinais mais importantes é a generalização do comportamento. Isso ocorre quando, mesmo sem a intervenção do terapeuta, o indivíduo com autismo consegue reproduzir o comportamento ensinado no espaço terapêutico e em outros espaços como: casa, escola, faculdade etc. Além, é claro, de maior autonomia na execução das tarefas da vida diária.
O que exatamente faz um acompanhante terapêutico no contexto do autismo?
Dentro da Terapia ABA, o Acompanhante Terapêutico (AT), tem como principal função auxiliar o indivíduo no manejo comportamental dentro do ambiente onde ele está inserido. Dentro da clínica, o AT é o aplicador de todo o planejamento elaborado para aquele indivíduo.
Qual a diferença entre o trabalho do AT e o do terapeuta ABA? Eles atuam juntos?
O AT atua como um aplicador das atividades e planejamento elaborados pelo terapeuta ABA. Eles trabalham juntos e seus trabalhos se complementam.
Em que ambientes o AT pode atuar? Só em casa e na escola ou também em espaços públicos?
Sim. O AT pode atuar nos espaços onde o indivíduo está necessitando de intervenção.
Como os pais podem saber se seu filho precisa de um AT?
Geralmente o médico responsável faz uma avaliação e encaminha o indivíduo para intervenções com terapia ABA.
A senhora tem uma forte formação em neurociência e educação. Como essa base influencia na forma de intervir com autistas em idade escolar?
O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento, isso significa que ele afeta o cérebro e o seu funcionamento, dito isso, podemos compreender que conhecer como esse cérebro funciona, faz muita diferença para o tipo de intervenção que iremos planejar para esse indivíduo. Alguns artigos trazem informações sobre o processo de aprendizagem de pessoas com
autismo. Muita das vezes, essa aprendizagem vai ocorrer de maneira peculiar ao cérebro autista, conhecer a respeito do cérebro pode tornar nosso ensino mais assertivo, qualificando nossa prática. Afinal, o pedagogo é um cientista da educação, experimentando métodos e recolhendo dados importantes para melhorar o ensino e auxiliar os alunos na aquisição e autonomia dos conceitos e conteúdos escolares.
O que as escolas mais erram quando recebem alunos com autismo?
Uma das maiores dificuldades que enfrentamos quanto a isso, está na falta de profissionais especializados dentro do contexto escolar. Tenho visto na minha prática que, com o profissional especializado, atender as demandas dos alunos com TEA ou outros transtornos de aprendizagem, se torna mais efetivo. Ter domínio da legislação, do conhecimento teórico e prático para implementar o Atendimento Educacional Especializado (AEE) é imprescindível dentro do contexto escolar. O AEE não é intuitivo, é preciso conhecimento para uma prática assertiva.
Que tipo de parceria entre escola, família e equipe terapêutica é essencial para que o autista aprenda e se desenvolva bem?
É fundamental que a equipe terapêutica, equipe multidisciplinar da escola e família, estejam juntas com troca de informações que são fundamentais para o desenvolvimento do aluno com TEA. Precisam ser forças que trabalham juntas. Uma intervenção isolada pode prejudicar a compreensão do aluno, porém quando essas três equipes trabalham com intervenções parecidas, funciona como um reforço, então obteremos mais rapidamente a generalização do comportamento esperado.
Ao longo da sua carreira, o que mais te emociona no trabalho com autistas?
Em minha experiência pude ver pessoas com autismo sendo alfabetizadas, outras alcançando seus objetivos de trabalho, outras ingressando no meio acadêmico. Contribuir com o aprendizado e a evolução do aluno é muito satisfatório e emocionante. Ver muitos deles, que apresentavam dificuldades no aprendizado e no processo de alfabetização, alcançando autonomia na leitura e escrita é muito estimulante. Ver as famílias colhendo os frutos de muito investimento financeiro e de tempo, é muito gratificante. Não há como descrever a emoção de ver o resultado de um trabalho sério e comprometido e dos
benefícios que isso traz para o autista e sua família.
Quais foram os maiores aprendizados que você teve atuando como terapeuta ABA e com equipes multidisciplinares?
Cada indivíduo com TEA é diferente. Embora ligados por um mesmo diagnóstico, é possível observar as diferenças que trazem por sua individualidade. Nesse sentido, o trabalho em equipe tem se mostrado muito mais eficaz. Todo indivíduo é multifacetado, portanto, o olhar múltiplo de diferentes profissionais é enriquecedor e torna as intervenções mais eficazes.
Que conselho a senhora daria para famílias que estão iniciando esse caminho e se
sentem perdidas ou sobrecarregadas?
Procurem um profissional especializado para auxiliar nesse processo. Acreditem nos seus filhos, porque diagnóstico não é sentença, com muita dedicação e intervenções assertivas, é possível alcançar resultados. Uma boa alternativa para rede de apoio é participar de grupo de apoio para pais, ajuda a compartilhar momentos de conquista e isso fortalece a esperança e renova as forças. A maternidade atípica é um desafio diário, é muito bom ouvir depoimentos de pessoas que passaram por esses desafios e estão conseguindo superá-los, ainda que isso represente, muita das vezes, presenciar pouco avanço ou
retrocesso. Dividir a carga torna tudo mais leve.
Livro Publicado
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