Masking? Como mulheres autistas camuflam seus comportamentos

O masking é uma estratégia de camuflagem social muito comum em mulheres autistas. Elas aprendem a imitar comportamentos neurotípicos para se adaptar ao ambiente, o que muitas vezes dificulta o diagnóstico e afeta profundamente a saúde mental. Neste post, vamos entender o que é o masking, como ele se manifesta e os impactos dessa prática na vida das mulheres autistas.

Muitas mulheres autistas passam anos tentando entender por que se sentem tão cansadas após interações sociais ou por que parecem sempre estar “representando”. O que muitas ainda não sabem é que essa sensação pode estar relacionada ao masking, ou camuflagem social — uma estratégia de adaptação desenvolvida, consciente ou inconscientemente, para esconder traços do autismo.

O masking no autismo feminino é uma das principais razões pelas quais tantas mulheres passam despercebidas nos processos de avaliação diagnóstica. Embora possa parecer funcional à primeira vista, essa camuflagem costuma ter um alto custo emocional e psicológico.

1. O que é o masking no autismo?

O termo masking vem do inglês e significa “mascaramento”. No contexto do autismo, refere-se a um conjunto de estratégias adotadas por pessoas no espectro para parecerem “neurotípicas”. Isso pode incluir:

  • Ensaiar e copiar expressões faciais e entonações;

  • Reprimir comportamentos autoestimuladores (como balançar o corpo ou mexer as mãos);

  • Forçar interações sociais mesmo quando há exaustão emocional;

  • Imitar o estilo de fala e vocabulário de outras pessoas;

  • Observar silenciosamente para depois tentar replicar “como se comportar”.

Essa prática é especialmente comum em mulheres autistas devido a pressões sociais para que sejam mais empáticas, sociáveis e emocionalmente disponíveis.

2. Por que o masking é mais comum em mulheres?

As meninas e mulheres são socializadas desde cedo para se ajustarem aos outros, serem educadas, discretas e prestativas. Por isso, muitas desenvolvem uma habilidade quase automática de observar e imitar comportamentos, mesmo que isso custe sua autenticidade e bem-estar.

Além disso, as manifestações do autismo em mulheres tendem a ser mais internalizadas: ansiedade, sobrecarga sensorial, confusão emocional e rigidez de pensamento são camufladas sob sorrisos, frases ensaiadas e comportamentos socialmente aceitos.

Estudos como os de Dr. Meng-Chuan Lai e Dra. Laura Hull mostram que o masking é mais intenso e frequente em mulheres do que em homens autistas, o que dificulta o diagnóstico e contribui para o subdiagnóstico feminino【1】【2】.

3. Exaustão e sofrimento silencioso

Embora o masking possa facilitar a aceitação social e evitar julgamentos, ele não resolve as dificuldades centrais do autismo — apenas as disfarça. Com o tempo, essa prática leva à:

  • Exaustão crônica;

  • Crises de ansiedade;

  • Depressão;

  • Burnout autista;

  • Perda de identidade (“não sei quem sou de verdade”).

Muitas mulheres relatam sentir que estão sempre atuando, se moldando ao que os outros esperam. Quando estão sozinhas, sentem um alívio por “tirar a máscara”, mas também culpa, solidão e confusão.

4. O masking afeta o diagnóstico

Por apresentarem comportamentos aparentemente adequados e por conseguirem manter relacionamentos superficiais, muitas mulheres autistas não se encaixam no perfil clássico do TEA descrito nos manuais diagnósticos. Isso leva profissionais da saúde a descartar o diagnóstico ou confundir os sintomas com outros transtornos, como:

  • Transtornos de ansiedade;

  • Transtornos de personalidade;

  • TDAH;

  • Depressão maior.

O problema é que, sem o diagnóstico correto, essas mulheres não recebem o suporte necessário, prolongando o sofrimento e aumentando o risco de colapso emocional.

5. Como identificar o masking em mulheres autistas

É importante considerar sinais indiretos de masking durante a avaliação clínica. Entre eles:

  • Relato de exaustão após situações sociais;

  • Dificuldade de manter relações íntimas ou profundas;

  • Sensação frequente de “não se encaixar”;

  • Episódios de colapso emocional em ambientes seguros (como em casa);

  • Habilidades sociais “aprendidas”, mas não naturais;

  • Sensação de estar “atuando” constantemente.

Avaliações sensíveis ao contexto feminino e entrevistas com familiares podem ajudar a revelar esses padrões.

6. Caminhos para tirar a máscara com segurança

Abandonar o masking é um processo delicado, que exige segurança emocional, apoio e autoconhecimento. Algumas estratégias incluem:

  • Ter contato com outras mulheres autistas e grupos de apoio;

  • Buscar profissionais que validem sua vivência;

  • Permitir-se descansar após interações sociais;

  • Reavaliar relações e ambientes que exigem esforço excessivo de adaptação;

  • Investir em autocompaixão e terapia centrada no reconhecimento da identidade autista.

Mais do que “se adaptar”, é essencial se aceitar e construir ambientes onde seja possível viver com autenticidade.

Conclusão

O masking no autismo feminino é uma resposta adaptativa a uma sociedade que exige que mulheres sejam sociáveis, controladas e emocionalmente disponíveis. Embora seja uma estratégia eficaz para evitar julgamentos, ela tem um custo alto: o esgotamento físico e emocional. Reconhecer o masking, especialmente em meninas e mulheres, é um passo essencial para um diagnóstico mais justo, um acolhimento mais humano e uma vida mais leve e autêntica.

Referências bibliográficas

  1. Hull, L., Mandy, W., & Petrides, K. V. (2017). “Putting on My Best Normal”: Social Camouflaging in Adults with Autism Spectrum Conditions. Journal of Autism and Developmental Disorders, 47(8), 2519–2534.

    https://doi.org/10.1007/s10803-017-3166-5

  2. Lai, M.-C., Lombardo, M. V., Ruigrok, A. N., Chakrabarti, B., & Baron-Cohen, S. (2015). Quantifying and exploring camouflaging in men and women with autism. Autism, 21(6), 690–702.

  3. Attwood, T. (2007). The Complete Guide to Asperger’s Syndrome. Jessica Kingsley Publishers.

  4. Bargiela, S., Steward, R., & Mandy, W. (2016). The Experiences of Late-diagnosed Women with Autism Spectrum Conditions: An Investigation of the Female Autism Phenotype. Journal of Autism and Developmental Disorders, 46(10), 3281–3294.

  5. Organização Mundial da Saúde (OMS). (2022). CID-11 – Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde.

    https://icd.who.int

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