A resistência a mudanças e transições é uma característica comum em pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Este post explica por que as transições podem ser tão desafiadoras, como isso impacta o cotidiano e apresenta estratégias práticas para tornar essas mudanças mais suaves e previsíveis.
Para muitas crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), até pequenas mudanças podem causar ansiedade, desorganização emocional ou comportamentos desafiadores. A simples transição de uma atividade para outra, ou de um ambiente para outro, pode ser percebida como algo imprevisível ou ameaçador.
Essas dificuldades estão diretamente ligadas ao funcionamento neurológico do autismo, que valoriza a previsibilidade, a rotina e o controle sobre o ambiente. Compreender essa sensibilidade é essencial para apoiar a pessoa autista de forma respeitosa e eficaz.
Neste post, vamos explorar o que são as dificuldades com transições, por que elas ocorrem, como afetam a rotina familiar e escolar e, principalmente, quais estratégias podem facilitar essas transições no dia a dia.
O que são transições e por que elas são difíceis para autistas?
No contexto do autismo, transições são quaisquer mudanças entre atividades, ambientes, tarefas ou contextos. Elas podem incluir:
•Ir de casa para a escola;
•Sair do banho para vestir-se;
•Terminar uma brincadeira para ir almoçar;
•Trocar de sala ou de professor na escola;
•Mudar de uma tarefa preferida para uma menos atrativa.
Essas mudanças, mesmo que simples para outras crianças, podem causar desconforto, frustração ou insegurança em crianças com TEA, pois envolvem:
•Interrupção do hiperfoco ou interesse específico;
•Perda do senso de controle;
•Incerteza sobre o que vai acontecer depois;
•Sobrecarga sensorial ou emocional.
Segundo a Autism Speaks e estudos da área, essa dificuldade está relacionada à rigidez cognitiva, um traço comum do espectro, que reduz a flexibilidade mental para lidar com imprevistos e mudanças inesperadas.
Impactos no cotidiano
A dificuldade com transições pode afetar várias esferas da vida da criança e de sua família:
•Atrasos e conflitos no dia a dia (ex: dificuldade para sair de casa);
• Crises de choro ou birras intensas ao mudar de atividade;
•Ansiedade antecipatória antes de eventos previstos (mudança de sala, férias, viagens);
•Prejuízos na aprendizagem, quando o aluno não consegue alternar tarefas na escola;
•Isolamento social, quando a criança evita ambientes ou eventos novos.
A boa notícia é que é possível trabalhar essas dificuldades com apoio adequado e estratégias personalizadas, que respeitem o tempo e o modo de funcionamento de cada criança.
Estratégias para facilitar transições no autismo
1. Antecipação com linguagem clara e objetiva
Explique com antecedência o que vai acontecer, utilizando frases simples e diretas, como: “Depois do banho, é hora de colocar a roupa.” Isso ajuda a criar previsibilidade.
2. Uso de recursos visuais
Quadros de rotina, timers visuais, pictogramas ou sequências em imagens ajudam a criança a visualizar o que vai acontecer e a se preparar emocionalmente.
3. Avisos com contagem regressiva
Dar avisos com antecedência — “faltam 5 minutos”, “último desenho” — ajuda a preparar a criança para o fim da atividade. O uso de alarmes sonoros pode complementar.
4. Manter uma rotina estruturada
Quanto mais previsível for o dia da criança, menor será o impacto das transições. Crie uma rotina com horários fixos, inclusive para as atividades preferidas.
5. Oferecer escolhas simples
Dar opções controladas, como “Você quer tomar banho com o patinho ou com o polvo?”, ajuda a criança a sentir mais controle sobre a situação e reduz a resistência.
6. Usar reforços positivos
Ao concluir uma transição de forma tranquila, elogie ou ofereça um reforço positivo. Isso ajuda a criar associações agradáveis com a mudança.
7. Incluir itens de transição
Algumas crianças se sentem mais seguras ao carregar um brinquedo preferido ou objeto sensorial de uma atividade para outra. Isso ajuda a reduzir a ansiedade.
8. Adaptar o ambiente
Evite ruídos, aglomerações ou estímulos visuais excessivos durante as transições. Um ambiente calmo favorece o processamento da mudança.
9. Treinar transições durante brincadeiras
Brincadeiras de faz de conta ou jogos com troca de regras ajudam a desenvolver flexibilidade cognitiva de forma lúdica e segura.
10. Buscar apoio profissional quando necessário
Se as dificuldades forem intensas e frequentes, o acompanhamento com profissionais como psicólogos, terapeutas ocupacionais e pedagogos pode ser essencial para criar estratégias personalizadas.
Conclusão
As transições fazem parte da vida — e para crianças com autismo, elas podem ser verdadeiros desafios. Com empatia, estrutura e apoio, é possível transformar esses momentos em oportunidades de crescimento e autonomia.
No Portal do TEA, acreditamos que respeitar o tempo da criança é o primeiro passo para construir uma rotina mais acolhedora e acessível. Cada avanço é uma conquista — e cada transição bem conduzida, um sinal de confiança e progresso.
Referências bibliográficas:
•American Psychiatric Association. DSM-5: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª ed.
•Autism Speaks. Managing Transitions. Disponível em: www.autismspeaks.org
•Attwood, Tony. The Complete Guide to Asperger’s Syndrome.
•Hodgdon, Linda. Visual Strategies for Improving Communication.
•Grandin, Temple. The Autistic Brain: Thinking Across the Spectrum.
•Baron-Cohen, Simon. Autism and the Empathizing-Systemizing Theory (2020).